15 fevereiro, segunda-feira, 2016 às 8:40 am
ComentáriosOs dias tem sido de muito calor em Porto Alegre. Os ânimos estão exaltados. Nas salas, o ar condicionado cria uma realidade paralela, essa falsa ilusão de que a natureza pode ser controlada. Do lado de fora, faz sol. Saio da produtora e encontro o meu amigo suando à sombra, fumando um cigarro e com certo desânimo no olhar. Estou atrasado, morrendo de fome, mas decido sentar alguns minutos para tentar entender o que está acontecendo.
No celular, ele me mostra, entre triste e indignado, o áudio de um programa de rádio no qual o apresentador instiga seus ouvintes a darem uma cusparada no presidente Lula. Meu amigo nunca votou no PT, jamais fez campanha para partido algum e nem parece muito interessado em política. Sua tristeza advém do fato de ter estado no carro, com o filho pequeno no banco de trás, escutando um programa supostamente engraçado, quando um jornalista passa a instigar a violência física como se fosse normal. “Simplesmente não é legal ninguém mandar cuspir na cara de ninguém”, me diz ele. Meu amigo é da paz, e por isso se sentiu agredido. Me despeço sem ter muito o que dizer. A imprensa anda raivosa demais e, talvez por isso, enfrente hoje umas de suas piores crises. A crise de credibilidade.
Dentro do táxi, tento reunir motivos que justificariam uma cusparada em Lula, o cara que presidiu o Brasil entre 2003 e 2011. O motorista tem o rádio ligado em um programa de opiniões cujos apresentadores defendem Jair Bolsonaro como a saída para o país. O mais exaltado dos jornalistas quer a prisão de Lula a qualquer custo. O taxista parece querer o mesmo.
Lembro que Lula terminou o seu segundo mandato com aprovação recorde da população, chegando a 80% de avaliações positivas. O governo do ex-operário foi marcado pela manutenção da estabilidade econômica, a retomada do crescimento do país e a redução da pobreza e da desigualdade social. A taxa de juros SELIC saiu dos 25%, quando Lula tomou posse, para 8,75% no segundo mandato, a menor taxa da história.
O cara criou o Bolsa Família, que prevê a transferência direta de renda para miseráveis e pobres, propiciando um consumo maior e beneficiando a economia. O programa ampliou o acesso à educação, considerada a melhor arma contra a pobreza. Através do ProUni (Programa Universidade para Todos), criou-se o maior acesso a bolsas de estudo da história da educação brasileira. Somente de 2005 a 2009, foram cerca de 600 mil bolsas em aproximadamente 1,5 mil instituições, que receberam como contrapartida a isenção de tributos. O investimento em ensino superior saltou de 0,6% do PIB em 2005, para 4,7% em 2008. O Luz para Todos levou energia elétrica para aproximadamente 10 milhões de pessoas vivendo em zonas rurais e áreas de difícil acesso.
Durante o governo Lula, o risco Brasil teve o menor índice da história. Houve erros, omissões e descasos? Muitos. Mas a democracia é um processo lento. Diferente das ditaduras e monarquias, o presidencialismo não confere poderes irrestritos à autoridade máxima do país. Tento encontrar motivos para seguir os mandamentos do radialista, mas não encontro razões para no ex-presidente cuspir.
Recapitulo alguns pontos do seu governo para tentar entender essa sede de vingança alimentada quase que constantemente por grande parte da grande imprensa. Esse ódio ao Lula e esse desejo de vê-lo preso custe o que custar não parecem condizer com o período mais festivo que a economia brasileira recente já atravessou, justamente quando ele estava no poder. Paralelo ao ódio ao ex-presidente, assiste-se ao declínio dos grandes meios de comunicação. A Folha de S.Paulo nunca vendeu tão pouco. A revista Veja nunca teve tão poucas páginas. O Jornal Nacional jamais enfrentou tão baixa audiência.
O ódio destilado no programa de rádio parece um bom exemplo para explicar a razão. Vivemos tempos de ódio cego e burro. Um ódio que agride até mesmo aqueles que simplesmente querem dirigir o carro com o filho no banco de trás dando risada de algumas piadas sem graça. Penso nas crianças e no quão grotescamente agressiva essa velha geração de jornalistas lhes parece ser. Não importa se à uma da tarde ou à uma da manhã, a apologia à cusparada nunca cai bem aos ouvidos da audiência.
Ismael Caneppele é escritor e colunista do Caderno Donna do Jornal Zero Hora
Fonte: Zero Hora
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