6 novembro, sexta-feira, 2020 às 4:58 pm
Comentários247 – Uma frase é consagrada como vulgaridade a cada eleição: o país saiu dividido. É dita com pompa, muitas vezes em tom grave, como se anunciasse um período de tensão e conflitos intermináveis.
Geralmente não significa quase nada. Mas é repetida sempre. Até as emas do Alvorada sabem que, se uma eleição é decidida entre dois candidatos, um deles terá a chance de ficar com quase metade dos votos.
Uma eleição assim divide um eleitorado ao meio, em toda parte, inclusive em associações de bairro. O vencedor chega lá, muitas vez, por um detalhe, por diferença mínima. Mas isso pode ser apenas um dado matemático.
No caso americano, com duas forças políticas históricas, a divisão sempre será assim. O vencedor pode ter uma pequena margem além da metade e raramente um pouco mais.
O eleitorado se divide, mesmo no confuso sistema americano em que um voto não vale um voto. Se valesse, a metade derrotada dos republicanos seria uma metade bem mais abalada e perderia quase todas as eleições.
Mas agora os Estados Unidos ficariam mais divididos do que seria o normal? Trump representará integralmente a metade do país derrotada? Essa metade é tão fascista quanto ele? É racista? É golpista?
É preciso mergulhar nas análises que os americanos vêm fazendo para concluir o previsível, dependendo de cada analista: Trump continuará extremista, forte e líder, dizem uns, ou Trump será um cachorro morto, dizem outros tantos.
A metade derrotada é a republicana, mas não necessariamente trumpista, assim como a metade vitoriosa na última eleição no Brasil não é bolsonarista.
Eis as perguntas. Trump conseguirá representar, agora na oposição e como líder populista furioso, a classe média branca ultraconservadora, os EUA do sul profundo, o supremacista, o povo anticomunista (que acha Biden de esquerda), os armamentistas, os trabalhadores que o trataram como ressuscitador de fábricas e de uma economia que não existe mais, os latinos adotados, o americano em total desalento?
O Trump que atacou ontem a Filadélfia e Detroit, por ressentimento de derrotado, mandou mais um recado aos militantes do racismo que mostra a cara. Essas são as áreas que devemos agredir.
O que os velhos republicanos da Filadélfia e de Detroit acham da agressão e da tentativa desesperada de aplicar um golpe por meio de ações na Justiça?
Trump criou seu espaço à direita da direita do partido, mas também acionou um alerta: ou os republicanos voltam a ser o que sempre foram, ou se transformam numa extensão da Ku Klux Klan.
O comportamento das grande redes de TV, que se negaram a continuar transmitindo ontem a sua fala com incitação à violência pode ser uma senha do que vem aí. As grandes corporações de mídia se articularam para largar Trump na sarjeta. Também ontem, 19 ex-procuradores da República emitiram uma nota pedindo sensatez a Trump e condenando a denúncia sem provas de fraude na eleição. Um detalhe: todos serviram a governos republicanos.
Líderes republicanos já condenaram a fala publicamente. Eleitos pelo partido para o Congresso se constrangem diante da acusação de que foram consagrados pelo voto de uma eleição que seu líder considera fraudada.
Trump vai carregar uma marca no topete. É o primeiro presidente, em 28 anos, derrotado na tentativa de se reeleger. É um perdedor, num momento em que a direita mundial pretendia continuar em ascensão e sob sua inspiração.
Observação do The New York Times: dos três presidentes derrotados desde a Segunda Guerra (Gerald Ford em 1976, Carter em 1980 e Bush em 1992, vencido por Clinton), só Bush conseguiu sobreviver politicamente, com alguma relevância como referência, e eleger um filho presidente em 2000.
Todos os derrotados tinham histórico na política e em seus partidos. Trump nunca foi nada. Todos saíram da Casa Branca como forças políticas esgotadas. Mas nenhum tinha patologias de caráter, grandes delitos fiscais a resolver, dívidas de bilhões, conduta política e social recriminadas e a repulsa dos adversários.
Barack Obama e Bill Clinton foram ao enterro de George Bush há dois anos e exaltaram seus feitos. Que ex-presidente democrata iria ao enterro de Trump?
Todos os que vinham tentando imitar Trump devem se preocupar. O perdedor poderá ser mais do que, como dizem os americanos, um pato manco.
O certo é que o destino de figuras como ele, depois de uma derrota, quase nunca será normal. É algo para Bolsonaro pensar, enquanto continua tomando seu guaraná Jesus.
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero Hora, de Porto Alegre.
Fonte: Brasil 247
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